Alguém pode ser zeloso por Deus sem saber o que está fazendo? Sim. O apóstolo Paulo era assim antes de sua conversão a Jesus a caminho de Damasco. Ele perseguia os cristãos fervorosamente achando com isso estar fazendo um serviço a Deus.
Depois ele escreveu de seus irmãos judeus: “Eles têm zelo por Deus, porém não com entendimento” (Rm 10.2). Quem crer também precisa pensar.
Os maiores opositores de Jesus não saírem das multidões, do meio do povo comum, mas eram os religiosos, os que lideravam a vida espiritual do povo, os que interpretavam a lei de Moisés e ditavam normas de conduta ao povo. Esses criticavam, discordavam e perseguiam Jesus o tempo todo. Eles não conseguiam ver a vida com os mesmos olhos com os quais Jesus olhava para Deus-Pai, para as Escrituras Sagradas, para as pessoas, e para as circunstâncias do dia a dia.
Numa dessas cenas comuns, Jesus se encontrava em casa, quando muitos publicanos e pecadores, ou seja, pessoas de má índole, de comportamento desprezível, e de moral reprovável, vieram e tomaram assento à mesa com Jesus e seus discípulos. Diga-se de passagem, que, tomar uma refeição com alguém no contexto oriental dos dias de Jesus, era uma demonstração de familiaridade e aceitação mútua entre as pessoas (Mt 9.10).
Quando os religiosos viram isso, começaram a questionar aos discípulos: “Por que come o vosso Mestre com os publicanos e pecadores?” (Mt 9.11). Para eles era inconcebível que pessoas de má fama tivessem tanta intimidade com pessoas que viviam para agradar a Deus. É exatamente isso que a igreja evangélica ainda não entendeu bem. O critério usado para dizer que as pessoas de Deus são as que estão dentro dos templos evangélicos, e as pessoas que vivem longe de Deus são as que não freqüentam uma igreja, é de uma ingenuidade tamanha que não dá para aceitar. A diferença entre os que são e os que não são é tão difícil de ser feita, que Jesus disse que é melhor deixar que os anjos de Deus cuidem disso no final dos tempos e que não sejamos precipitados em decidir nesse particular (Mt 13.24-30, 36-43).
Ao ouvir a censura dos fariseus, Jesus disse: “Os sãos não precisam de médico, e sim os doentes. Ide, porém, e aprendei o que significa: Misericórdia quero e não holocaustos; pois não vim chamar justos, e sim pecadores [ao arrependimento]” (Mt 9.12-13). Essas palavras de Jesus não condizem com a praticidade evangélica de nossos dias, salvo, raras exceções. Pouca gente na igreja está interessada em cuidar de doentes. Pessoas “justas” é tudo o que a igreja quer e não pecadores. Misericórdia! Ah! Misericórdia! Essa só na teoria. O que o “povão de Deus” gosta mesmo é de holocaustos, ou seja, de sacrifícios. O povo gosta mesmo é de campanhas, subir ao monte, vigílias, jejuns, regrinhas de pode e não pode para tudo, barganhas com Deus através de dízimos e ofertas (como se Deus barganhasse com alguém). O amor ralo só existe entre os que se cajunegam mutuamente. Os que pisam na bola são tirados de campo rapidamente. Os feridos vão ficando para trás. Cansei desse ambiente de sorrisos amarelos, tapinhas nas costas com uma mão e apunhalamento com a outra.
Essa frase de Jesus: “Misericórdia quero e não holocaustos”, me saltaram aos olhos como minhas, pois é exatamente isso que quero daqui para a frente. Estou fugindo de sistemas castrantes, programas estéreis, estudos e mais estudos que não penetram na cabecinha da maioria e que deixam alguns poucos com uma cabeça monstruosa, mas que os demais membros do corpo continuam nanicos. A Bíblia diz: “O saber ensoberbece, mas o amor edifica” (1Co 8.1). Existe muito saber, muitas informações, muitas anotações, o que resulta em vaidade, prepotência e arrogância em muitos, mas, o amor mesmo que edifica, esse é cantado, pregado, falado, mas desconhecido na vivência eclesiástica. Quero misericórdia para os outros, e quero misericórdia para mim. Chega de sacrifícios de tolos.
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